PORTAS, 'COSE CHE SONO SOLO SE STESSE'?
POR SEBASTIANO RAIMONDO
Sebastiano Antonio Raimondo nasceu em 1981, em Gangi, na Sicília.
Nos anos em que a imagem digital começava a ganhar mais espaço, tanto na representação do projecto arquitectónico, como na vida de cada pessoa, levou a cabo uma reflexão sobre a capacidade dessa gerar a ideia de lugar e o papel da fotografia nessa representação e na vida comum das pessoas. Foi fundamental o encontro com o fotógrafo e professor Giovanni Chiaramonte na Faculdade de Arquitetura de Palermo, com o qual começou a dedicar-se totalmente à fotografia, identificando-se com a tradição da fotografia de paisagem italiana.
Em 2009 foi autor de “avere luogo – immagini di un’idea di paesaggio”, trabalho que surgiu da necessidade de utilizar a fotografia como meio de expressão para orientar-se no mundo, entre a paisagem urbana, natural e aquela que já se encontra representada.
Em 2010 elabora “uma ponte”, trabalho realizado em Lisboa, cidade onde decidiu terminar os seus estudos com uma tese de fotografia, orientada por Giovanni Chiaramonte e pelo Professor Arquiteto Paulo Alexandre Tormenta Pinto.
Em 2013 publicou “Sob a luz do sol também os sons brilham” artigo e fotografias para a revista portuguesa “Passagens”, uma viagem na CRIL de Lisboa, onde se mostra como construir um lugar e habitar esse espaço com a fotografia. Desde 2013 faz parte do grupo “presente infinito”, colectivo de jovens fotógrafos italianos, com quem realizou o livro manifesto homónimo, varias exposições pela Itália e o projeto comum “Napoli 2015 – nuova luce”.
Actualmente, vive em Lisboa onde prossegue os seus estudos com um Doutoramento em Arquitetura dos Territórios Metropolitanos Contemporâneos, no ISCTE-IUL.
Synopsis
O título è retirado de dois textos que aqui cito breves trechos [1].
O breve texto que segue tem por ambição apresentar o estado e progressão da minha pesquisa fotográfica em redor do conceito de limiar. Considerando que a experiência de transpor uma porta é na sua totalidade de complexa restituição, envolvendo todos os sentidos, sem que nenhum deles seja privilegiado ou disponha sequer de um dispositivo adequado à sua encenação. A sequência de imagens é subdividida em partes e tal como numa narração lógica começa pelas hipóteses, segue-lhe uma argumentação e termina, com outras possíveis vias, de forma aberta.
Esta pesquisa é conduzida através da fotografia com referimentos a “Passages de Paris” de Walter Benjamin, aqui o autor identifica na imagem veloz a possibilidade de manifestação do limiar [2]. Em primeiro lugar, pensei que a fotografia, enquanto análoga do visível e devido à sua particular relação com a temporalidade, poderia ser um instrumento apropriado para indagar e tornar visível a porção de tempo que intercorre entre um e o outro lado do limiar. Procurei pesquisar a “realidade” de uma porta indo além da ideia espacial de limite ou confim, tentando compreender aquilo que a fotografia poderia dizer antes, durante e depois do limiar.
Indagar a porta “através [3] da fotografia significa olhar para ela como que de uma janela [4], coisa bem diferente de atravessá-la fisicamente porque o próprio instrumento, a partir do aparecimento da perspectiva e da objectiva [5] foi concebido como uma janela, no sentido arquitectónico do termo [6], a partir da qual observar o mundo e construir dele uma imagem. Estas imagens tentam colocar-se, por isso, no limiar entre a realidade ontológica (os objectos ou os espaços representáveis) e o conseguinte “real epistemológico” (objectos e lugares representados) [7].
Enquanto fotógrafo, creio numa teoria do olhar, “... entendida como o lugar onde o sujeito cumpre a própria experiência da luz [8] e penso no primado que reside no facto de esta responder expressivamente (não no reagir) à realidade indo-lhe ao encontro e cuidando dela. Quem olha responde, não vê simplesmente, o que não é necessariamente corresponder à essência das coisas porque tem a que ver com aquele que olha e é influenciado pela própria experiência.
Só se consegue ver para lá do limiar, com a luz que procura uma figura e que tenta transformar a janela em espelho: possibilidade de olharmo-nos enquanto se olha. Esse olhar não nos dá a posse exclusiva de alguma coisa, é mais um instrumento que não deve cessar nunca de procurar, animado apenas pela esperança de encontrar uma via; um caminho cuja marca no terreno só permanece quando percorrido quotidianamente.
Este projecto termina momentaneamente com um caminho de regresso a casa, um repercorrer a própria estrada como num mapa [9], que leva diante de uma porta. Aquela casa não é mais aquela de um tempo e hoje posso atravessar a sua porta apenas com a minha sombra, pois penso que a maioria das imagens de que é feito hoje o mundo voltaram a ser simplesmente janelas. Estamos ainda à espera de atravessar aquele limiar do qual fala Benjamin, uma imagem charneira que como um espelho transparente esperamos atravessar para passar do sonho, já não aquele surrealista, à vigília.
Um limiar antes de ser atravessado é uma margem da qual, tal como de uma janela, podemos apenas imaginar, talvez ver, aquilo que está diante de nós. A travessia do limiar é dimensão temporal, um fragmento [10], uma fração de segundo vista da nossa janela. Visitar este lugar com a fotografia, que para mim é uma experiência espacial e performativa de procura de um equilíbrio, com o outro e com o mundo [11], é o que este trabalho quer transmitir.
Uma possibilidade entre outras experiências.
[1] O primeiro in Paolo Costantini, Cose che sono solo se stesse. Milano Montreal 1996, Electa CCA.
“… forse per questo io affido a frammenti dispersi, intuizioni … il compito di trasformare in piccole certezze, un insieme di punti da unire tra di loro per tracciare un itineriario possibile, come fossero i sassi di Pollicino, per ritrovare una strada…”.
O segundo in Aldo Rossi, Autobiografia scientifica. Milano 2009, Il Saggiatore.
“… mi interessano molto le cose che stanno per dirsi e il meccanismo con cui si potrebbero dire, pur sapendo che un altro più oscuro impedisce il compiersi regolare delle operazioni necessarie perché qualcosa avvenga…”.
Este projecto nasceu em 2011 e foi publicado originalmente na revista digital Interact n°21 del CECL, Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens, em 2014, no link http://interact.com.pt/21/porte/
As fotografias desta pequisa, ainda não concluída, foram feitas em pelicola 120 entre 2011 e 2015, simplesmente extraída da prova a contato para poderem refletir e começar a mostra-las antes que seja feita uma ulterior seleção e que sejam pré-estampadas e produzidas em definitivo.
[2] Walter Benjamin, I passages di Parigi. Torino 2001, Piccola Biblioteca Einaudi.
[3] Cfr. Erwin Panofsky, La prospettiva come “forma simbolica” e altri scritti. A cura di Guido Neri con una nota di Marisa Dalai. Milano 1966, collana SC/10, Giangiacomo Feltrinelli Editore.
[4] Cfr. Sebastiano Antonio Raimondo, Uma ponte – La fotografia, un modo di abitare il mondo e costruirlo. Tesi di Laurea, relatori Prof. Giovanni Chiaramonte e Prof. Arq. Paulo Alexandre Tormenta Pinto. Università degli studi di Palermo AA 2013, Facoltà di Architettura.
[5] Cfr. Chiaramonte Giovanni, Storia della fotografia. Milano 1983, Jacabook.
[6] Cfr. Sebastiano Raimondo, Avere luogo – immagini di un’idea di paesaggio. Palermo 2009.
[7] Para o significado de espaço e lugar cfr. E. Garlaschelli S. Petrosino, Lo stare degli uomini – sul senso dell’abitare e sul suo dramma. Genova Milano 2002, Casa Editrice Marietti S.A. Para o uso diverso das palavras realidade e real em relação a ontologia e iconologia cfr. Bentornata realtà – il nuovo realismo in discussione, a cura di Mario De Caro e Maurizio Ferraris. Torino 2012, Giulio Einaudi Editore.
[8] Cfr. Silvano Petrosino, Piccola Metafisica della Luce. Milano 2014, Editoriale Jaca Book.
[9] Cfr. Franco Farinelli, Guillaume Monsaigeon, M. Gonçalo Tavares, Mappamundi, Lisbona 2011, Museu Coleção Berardo. Op Cit. Erwin Panofsky, La prospettiva come “forma simbolica” e altri scritti.
[10] Cfr. Rosalind Krauss, Teoria e storia della fotografia. Milano 1996, Edizioni Scolastiche Bruno Mondadori.
[11] Cfr. Sebastiano Raimondo, Sob a luz do sol também os sons brilham, in Paulo Alexandre Tormenta Pinto, PAISAGENS DISTANTES, a CRIL uma avenida pós-moderna . Passangens nº1, Lisboa 2013, Caleidoscópio. Op. cit. Sebastiano Antonio Raimento, Uma ponteo - La fotografia, un modo di abitare il mondo e construirlo.